Especialistas abordam questões trabalhistas, contratuais, tributárias e levantam prós e contras dessa forma de contratação
O primeiro projeto sobre terceirização tramitou na Câmara dos Deputados em 1998, no governo FHC. Assunto antigo, como se vê; porém, longe de estar esgotado. Ao contrário, voltou a ganhar espaço na mídia desde o dia 30 de agosto, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela legalidade da terceirização da atividade-fim pelas empresas.
O tema ainda gera dúvidas e divide opiniões. Há quem prefira contratar e gerir sua própria equipe de funcionários. Outros defendem terceirizar a mão de obra.
Para esclarecer suas dúvidas, ou para você saber o que é melhor para o seu Condomínio, entenda as regras que regem a terceirização, conheça os cuidados necessários na escolha da empresa terceirizadora e no dia a dia do contrato; e, muito importante, saiba quais são as responsabilidades das partes.
Acompanhe, a seguir, a orientação dos nossos especialistas:
1) O que a nova legislação diz hoje sobre a terceirização em condomínios? Está liberada para condomínios em todo país?
Em primeiro lugar, a nova lei autoriza a terceirização de atividade-fim, o que representa qualquer atividade profissional em condomínios. A partir daí:
- Prevê, expressamente, que o contratante (condomínio) seja subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas eventualmente inadimplidas pela empresa contratada quanto aos seus empregados, referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços;
- Impede o reconhecimento do vínculo empregatício direto entre o empregado da empresa contratada (terceirizada) com o tomador de serviços (condomínio).
- Permite que a empresa contratada (terceirizadora) subcontrate serviços de outra prestadora de serviços;
A regra geral está liberada para os condomínios — menos para a região do ABC de São Paulo, que não podem contratar terceirizados, entendendo pela legalidade e legitimidade das cláusulas 32 e 33 da CCT 2016/2017, que proíbem a terceirização de serviços na categoria.
“No ABC também está proibido a implantação de portaria virtual nos condomínios, por se entender que a tecnologia retira postos de trabalho dos empregados e deixa os condomínios sem a proteção que o trabalhador confere aos moradores”, acrescenta o advogado trabalhista Guilherme Lemos Novaes.
Novaes ainda destaca que no estado do Tocantins, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) anulou cláusula que impedia Terceirização em Condomínios. “O entendimento prevalecente foi o de que a proibição atinge a livre iniciativa empresarial para a consecução de objetivo considerado regular e lícito”, resume.
- Veja aqui a nova lei 13.429/2017 sobre terceirização na íntegra.
2) Para quais cargos do Condomínio a legislação permite terceirizar?
Antes da vigência da Lei 13.429/2017, em âmbito geral, havia a proibição de terceirização da atividade-fim do contratante, como zeladoria. Apenas as atividades-meio eram admitidas, como serviços de limpeza, conservação e vigilância.
“Existia, ainda, discussão a respeito desta interpretação, em se tratando de contratantes-condomínios, já que, por sua natureza, sempre diferiram da característica de estabelecimento comercial, o que lhe retiraria conceito de atividade-fim”, explica o advogado Rodrigo Coelho.
Depois do início da vigência da Lei de Terceirização, qualquer atividade tornou-se passível de terceirização, incluindo as atividades-fim, como serviços de zeladoria e administrativo interno.
3) O Condomínio pode sofrer ação trabalhista, mesmo trabalhando com funcionários terceirizados?
Sim, pode. Uma das mais relevantes alterações promovidas pela Lei 13.429/2017 e mantida pela Lei 13.467/2017, no campo da terceirização, foi a expressa previsão, no novo artigo 5º-A, § 5º, da Lei 6.019/73 da responsabilização subsidiária da contratante (condomínio) pelos créditos dos trabalhadores que prestam serviços em seu benefício.
Ou seja, o fenômeno da terceirização não expurga, por completo, a possibilidade de ajuizamento de ação judicial (direito de ação – garantia constitucional), com inclusão do Condomínio, enquanto contratante, por qualquer trabalhador que se sinta ofendido.
“Naturalmente, ao Condomínio será dado todo o direito de ampla defesa e contraditório, em eventual reclamação trabalhista contra ele proposta”, ressalva Rodrigo Coelho.
4) Quais os principais cuidados na contratação da Terceirizadora e, posteriormente, para evitar ou minimizar riscos trabalhistas?
Como em qualquer contratação, o síndico tem que ter cautela. Porém, no caso da Terceirizadora, o cuidado deve ser redobrado, pois a partir da decretação de falência da empresa, as obrigações passam a ser de sua responsabilidade. Sem falar que essa responsabilidade também se estende aos encargos não pagos pela contratada. [veja mais na pergunta 09]
Uma boa medida é pedir referências de outros condomínios atendidos pela empresa e conversar com os síndicos para tirar informações. Veja a orientação do advogado Guilherme Lemos Novaes:
Antes de contratar a Terceirizadora, verifique:
- Se a empresa terceirizada é solvente, se tem ações trabalhistas;
- A reputação da empresa perante o mercado;
- Se a empresa possui os alvarás de funcionamento e os registros em dia;
- Se a empresa possui os programas obrigatórios de medicina e saúde do trabalho;
- O contrato social para verificar o capital social;
- Certidões negativas de débito;
- O tempo de CNPJ da empresa;
- Relatório com informações trabalhistas dos empregados que prestarão os serviços no condomínio.
Para evitar problemas trabalhistas após a contratação:
- Exija a nota fiscal da prestação de serviços, bem como os comprovantes de pagamento dos salários dos funcionários;
- O síndico deve exigir, de forma expressa, a apresentação de cópias das guias de recolhimento do INSS, FGTS e demais encargos dos funcionários;
- No contrato, especificar o valor do contrato com detalhamento do escopo de trabalho, dos equipamentos e dos serviços a serem prestados e deve também especificar a forma de cobrança que será feita ao condomínio.
– Veja aqui mais cuidados na contratação e quais documentos pedir à empresa de terceirização
5) O que caracteriza a cláusula abusiva de rescisão?
O próprio nome já diz, a abusividade. Por exemplo, uma cláusula que estabelece retenção de 50% do valor do contrato firmado entre as partes, em caso de desistência unilateral do contratante, é abusiva.
Nesse caso, 20% são considerados um valor justo.
“Assim já decidiu a 3ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 0705830-66.2016.8.07.0003”, reforça o advogado Guilherme Lemos Novaes.
6) Se um funcionário terceirizado se acidentar, o condomínio terá que pagar indenização?
Em direito trabalhista, a responsabilidade é objetiva, ou seja, a empresa sempre responde pelo acidente do funcionário — desde que ele prove o dano causado pela empregadora. No Condomínio, a responsabilidade é da Terceirizadora, mas ele responde de forma subsidiária.
7) Se a Terceirizadora falir, o que acontecerá?
- O Condomínio é solidário e será responsabilizado pela quitação dos salários de funcionários, caso a empresa não tenha condições.
- Com a decretação da falência e assumindo o passivo da Terceirizadora, o condomínio pode entrar com uma ação de regresso na justiça cível pedindo o ressarcimento dos prejuízos. “Contudo, pode se levar anos até que esse valor seja recuperado”, avisa Novaes.
Por isso, é fundamental acompanhar bem de perto a regularidade da empresa.
Desconfie de empresas que praticam valores muito abaixo da concorrência.
8) Quais os sinais/sintomas de que pode haver algo de errado com a Terceirizadora?
- O síndico deve ficar atento a reclamações dos funcionários sobre atrasos no pagamento do salário, benefícios e vale transporte.
- O Condomínio deve também verificar se as guias de INSS e FGTS estão sendo pagas em dia. “Atrasos recorrentes não são um bom sinal”, analisa Fernando Fornícola, presidente da Administradora Habitacional.
- Outro indício de que a empresa não inspira confiança também é a alta rotatividade de funcionários. Sempre é bom questionar a empresa sobre o por quê dessa troca constante.
9) O que pedir para a empresa contratada durante a vigência do contrato com o Condomínio? Em que periodicidade?
Em uma rápida pesquisa, você já poderá dar subsídios ao condomínio e ao conselho da situação da Terceirizadora. Esse procedimento é fundamental, em virtude da responsabilidade tributária solidária que o “Código Tributário Nacional” impõe (Art. 186).
Recomenda-se constar em Contrato que a empresa deve encaminhar:
- MENSALMENTE, junto com a Nota Fiscal e o boleto para pagamento, o comprovante de quitação das guias de INSS e FGTS, além da folha de pagamento ou holerites relativos aos funcionários alocados no Condomínio;
- SEMESTRALMENTE, as Certidões Negativas de Débitos (CNDs);
- ANUALMENTE, o recibo de entrega do IRPF à Receita Federal.
O síndico também pode fazer o levantamento das CNDs por conta própria. Como não existe um site único que concentre todas as informações, o contador especialista em condomínios, Marcos Roberto Gouveia, selecionou as fontes mais confiáveis para fazer a busca:
- RECEITA FEDERAL / PREVIDÊNCIA SOCIAL – UNIFICADAS
- FUNDO DE GARANTIA (FGTS)
- CERTIDÃO TRABALHISTA (IMPORTANTE: CONDOMÍNIOS LOCALIZADOS EM SÃO PAULO)
10) O que é recomendável que a Terceirizadora cheque sobre o funcionário contratado que irá trabalhar no Condomínio?
Além do grau de preparo e capacitação, experiência e histórico profissional, referências, documentação, se tem residência fixa, o mais importante é a verificação dos antecedentes criminais.
11) Pode-se exigir que os funcionários de uma Terceirizadora sejam treinados continuamente?
“Sem dúvida. O treinamento contínuo, aliás, é um dos diferencias ou vantagens que o Condomínio espera ao terceirizar o seu quadro”, afirma o administrador Fernando Fornícola.
12) O Condomínio pode contratar um funcionário da Terceirizadora que está prestando serviço?
Teoricamente, não há qualquer impedimento. Mas tenha no seu radar duas observações importantes:
- Existe o risco de o empregado buscar a Justiça do Trabalho, na tentativa de reconhecimento do vínculo de empregado desde quando era prestador de serviços terceirizado.
- Alguns contratos de prestação de serviços estabelecem prazo mínimo de 18 meses para que se permita tal contratação (popularmente chamado de “quarentena”), sendo certo que o seu descumprimento poderá acarretar pesada multa contratual.
13) Como deve ser o recolhimento de tributos da empresa Terceirizadora? O Condomínio paga retenção?
Em determinados tipos de serviços, o contratante (condomínio) tem a responsabilidade perante o Fisco de reter e recolher ao órgão público o devido tributo. Na hipótese de serem empresas terceirizadas, a obrigatoriedade é sempre do condomínio.
14) Quais as artimanhas de uma Terceirizadora para fraudar pagamentos de encargos e obrigações?
De acordo com Marcos Roberto Gouveia, uma situação comum é a Terceirizadora abater um percentual de 50% sobre a base de retenção previdenciária (11%).
Dessa forma, aconselha Gouveia, o síndico deve estar atento, pois ela só caberá se constar em contrato e for efetivamente fornecido material indispensável para a execução do serviço contratado.
“Normalmente, essa redução cabe em casos de empreitada, ou seja, obras e manutenção. No caso de portaria e vigilância, a Previdência Social permite abater somente Vale Transporte e Vale Alimentação/Refeição”, afirma.
15) O que pode acontecer com o Condomínio se a Terceirizadora não pagar os encargos?
Esta deve ser tratada como uma situação importante para o corpo diretivo, já que a lei considera a responsabilidade tributária solidária que esta relação contratual traz ao contratante.
O Condomínio pode ser solidário também em ações trabalhistas. Segundo os art. 186 do CTN e art. 449 da CLT, a responsabilidade subsidiária é aplicável quando ficar evidente que a empresa prestadora é inadimplente quanto aos títulos trabalhistas de seus empregados.
16) Empresa de terceirização pode ser optante do Simples como forma de tributação?
É importante saber que a lei prevê duas situações no que se refere à mão de obra.
De acordo com o advogado Guilherme Lemos Novaes, as Terceirizadoras de mão de obra (recepção, portaria e ascensorista) não podem optar pelo Simples Nacional, nos termos do art. 17, XII da Lei Complementar nº 123/06.
“Uma eventual fiscalização da Receita Federal pode acarretar o desenquadramento do Simples. Com isso, a empresa seria obrigada a recolher a diferença de ISS juntamente com a respectiva atualização monetária, e a eventual responsabilidade do Condomínio do pagamento da diferença”, afirma.
Já as Terceirizadoras de atividades de vigilância, limpeza ou conservação podem optar pelo Simples, de acordo com o 5º-C do art. 18 da LC 123/2006.
Outras atividades, como construção de imóveis e obras de engenharia em geral, inclusive sob a forma de subempreitada, execução de projetos e serviços de paisagismo, bem como decoração de interiores, também podem ser optantes do Simples Nacional.
17) É mais barato terceirizar do que ter funcionários próprios?
Logo que a opção da terceirização surgiu, muitos condomínios optaram pela modalidade para conseguir economizar.
Hoje, não é o que se vê praticado no mercado. Os custos com uma empresa séria de terceirização não se afastam muito do que custaria um funcionário próprio, uma vez que os encargos e direitos trabalhistas são os mesmos, e ainda deve ser inserido o lucro da empresa nessa conta.
Por isso, contratar aquela empresa que oferece o valor muito mais barato que a concorrência pode não ser uma boa opção. Afinal, se o preço da mesma é tão competitivo, a terceirizadora pode estar pagando os funcionários abaixo do piso da categoria, ou não quitando os encargos e tributos devidos, o que pode, no futuro, se revelar um passivo para o condomínio.
18) Quais as vantagens e as desvantagens de terceirizar?
Optar pela terceirização pode ser vantajoso, segundo Satgi.
“Se você colocar tudo na ponta do lápis, é até provável que fique mais barato contratar um funcionário do que terceirizar a mão de obra. Entretanto, pela burocracia, pelos encargos e passivos trabalhistas, no final das contas, pode ser mais caro ter um funcionário próprio. A dor de cabeça, pelo menos, pode ser bem maior”.
Já o síndico profissional Nilton Savieto acha que vale a pena investir na equipe de funcionários contratados pelo condomínio:
“Quando eu contrato um funcionário próprio, posso pagar um salário maior. Além de ter custo menor, tenho controle sobre o trabalho dele e posso exigir na hora o resultado que desejo. Com a terceirização, o Condomínio ainda se responsabiliza por eventuais questões de encargos ou inadimplência”, justifica Savieto.
Para chegar às suas próprias conclusões, coloque na balança:
VANTAGENS
- Toda a responsabilidade pela gestão de RH, por exemplo, contrato de trabalho, salários, benefícios (vale refeição, vale transporte e outros), resolver questões pessoais ou profissionais ficam a cargo da Terceirizadora;
- Para a Terceirizadora também cabe recolher os encargos como INSS e FGTS; fazer a rescisão de contrato;
- Não há preocupação em providenciar e fazer a manutenção de uniforme, EPI etc.; bem como realizar treinamento e acompanhamento do trabalho;
- O risco é consideravelmente mais baixo de sofrer ações trabalhistas por funcionários insatisfeitos;
- O síndico pode solicitar o perfil profissional de acordo as necessidades do Condomínio.
- As empresas têm plantonistas para suprir faltas, férias, e também dispõem de folguistas – assim, economiza-se com horas extras.
DESVANTAGENS
- Alta rotatividade, mais comum na mão de obra terceirizada;
- Muitos moradores encaram de modo negativo o fato de o profissional ser desconhecido, e não mais aquele funcionário com anos de casa, com quem desenvolvem uma relação de afeto e confiança;
- As questões ligadas à legislação, que responsabilizam o condomínio quando ocorre inadimplência ou falência da Terceirizadora;
- A necessidade de checar periodicamente a regularidade fiscal e a saúde financeira da contratada.
- Custo global final um pouco maior.
19) Precisa de assembleia para terceirizar os funcionários? E para trocar a empresa terceirizada?
Segundo o advogado Rodrigo Karpat, em caso de troca de funcionários próprios por terceirizados, ou vice e versa, pelo fato de envolver custos com rescisão ou troca sistemática de funcionamento, deverá ocorrer somente mediante aprovação em assembleia por maioria simples, como explica o art. 1352 do Código Civil.
Já a troca de uma terceirizadora por outra não há a obrigatoriedade de assembleia. Entretanto, se a troca de empresa for gerar impacto nas finanças e distorcer a previsão orçamentária, deve-se, sim, levar o assunto à assembleia, que vota por maioria simples.
20) O síndico pode tratar diretamente com os funcionários terceirizados? Quais cuidados tomar?
Se precisar chamar a atenção ou algum problema ocorrer, melhor avisar a Terceirizadora, que irá tratar diretamente com o profissional.
Como responsável por essa contratação, ela deverá tomar as devidas providências e fornecer um feedback ao síndico.
Sempre bom reforçar que a terceirização é permitida para os condomínios em geral, desde que não haja subordinação direta ao síndico, sob pena de ser reconhecido o vínculo empregatício.
Fonte: Sindico Net