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Convenção condominial e a imposição do síndico escolhido pela construtora

É corriqueiro que as construtoras incluam na convenção do condomínio cláusulas abusivas que trazem onerosidade excessiva aos condomínios, impondo-as na assembleia de instalação, tais como: a cláusula de imposição de síndico pelo período inicial de dois anos, ou da não obrigatoriedade do pagamento das cotas condominiais das unidades não negociadas.

Ocorre que no momento do registro da convenção dos empreendimentos, ou na ratificação da minuta da convenção antes do habite-se, as construtoras detêm boa parte das unidades privativas, o que resulta em uma verdadeira imposição das cláusulas dispostas na convenção e não propriamente uma busca ao atendimento dos interesses coletivos dos condôminos que habitarão aquele empreendimento

De praxe, as construtoras inserem na convenção cláusulas que as favorecem, como por exemplo, aquelas que permitem o pagamento de determinado percentual (menor) de cota condominial das unidades ainda não comercializadas. Esse tipo de operação tem sido reconhecido como abusivo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ. 3ª Turma. REsp 1.816.039-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 04/02/2020 (Info 664).

Também são eivadas de vícios as cláusulas que impõe aos condôminos, durante os 2 (dois) primeiros anos da entrega do condomínio, que o síndico e a administradora sejam aqueles escolhidos pela construtora.

É evidente que  a convenção condominial lavrada e aprovada pela própria construtora, fixa  a injusta disposição na qual os condôminos têm arbitrariamente tolhido seu direito legítimo de votar naqueles administradores que irão realizar a gestão do patrimônio comum, sendo assim, obrigados a simplesmente aceitar o síndico e empresa administradora, sem passar ao crivo da assembleia, de acordo com as disposições contidas no Código Civil, artigo 1.347, o qual dispõe que:

Art. 1.347. A assembleia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino, para administrar o condomínio, por prazo não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se.

A doutrina ensina que: a escolha do síndico é feita em assembleia geral, na qual votam condôminos, compromissários- compradores, cessionários de seus direitos e usufrutuários. (Francisco Eduardo Loureiro – Código Civil Comentado: doutrina de jurisprudência/Cláudia Luiz Bueno de Godoy [et. al.]; coordenador Cezar Peluso – 13. Ed – Barueri – SP – Manolo 2019. – Pag. 1.335, 1.336).

Não é demais lembrar que o síndico é o responsável legal do condomínio (Artigo 1.348, II, do Código Civil) e em nome da massa condominial  poderá praticar todos os atos necessários à gestão, tais como: administrar as contas do condomínio, contratar prestadores de serviços, empregados etc. e nesse momento extremamente sensível  que é o início do condomínio, onde certamente haverá ainda questões relativas às obras entregues pelas construtoras, certamente o síndico e administradora impostos pelas construtoras não terão a imparcialidade necessária para a resolução dos problemas.

Atenta a essa questão, a decisão proferida em sede de tutela antecipada, tornou sem efeito o item “Da Ordem do Dia” de uma Assembleia de Instalação diante da imposição pela construtora de um síndico de sua livre escolha, bem como a prerrogativa unilateral da incorporadora de definir quem será o subsíndico do condomínio, bem como a administradora, tudo baseado em abusiva cláusula da convenção.

A decisão liminar ordenou a convocação de nova assembleia no prazo de 30 (trinta) dias e, ainda, mitigou o direito ao voto da construtora para limitá-lo a 1 (voto) para cada 5 (cinco) unidades, restabelecendo a igualdade de voto, dada a desvantagem dos condôminos face o construtor que detém a maioria das unidades privativas.

A concessão de tutela de urgência demanda a comprovação, pelo postulante, da satisfação dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora.

No caso sob análise, ambos estão presentes.

 

A previsão em convenção condominial de que o primeiro síndico e a administradora do condomínio serão indicados pela empresa instituidora tem sido reiteradamente considerada abusiva pelos tribunais pátrios. Tal previsão coloca os consumidores em situação de excessiva desvantagem, sem efetiva participação nas decisões sobre a administração e gestão do patrimônio comum, sujeitando-se ao puro arbítrio da incorporadora.

Ademais, cabendo ao síndico representar a massa condominial em juízo, sua indicação pela incorporadora tolhe a independência que é necessária, por exemplo, para formulação de reivindicações judiciais e extrajudiciais em caso de vícios construtivos ou desconformidades estruturais.

(…)

Outrossim, o domínio da incorporadora sobre um expressivo número deu unidades autônomas ainda não comercializadas ocasiona inequívoco desequilíbrio de forças no ambiente deliberativo assemblear. Afinal, a fração ideal majoritária do solo e das demais partes comuns detida pela incorporadora representa, nos termos do artigo 1.352, parágrafo único, do Código Civil, maioria absoluta dos votos nas deliberações em assembleia. Uma interpretação fria e mecânica da lei, dissociada dos princípios regentes da comunhão condominial, acarretaria concessão de poder absoluto à instituidora para tomada de decisões e determinação dos rumos a serem adotados na gestão da coisa comum. Novamente, significaria desvantagem excessiva aos consumidores adquirentes das unidades autônomas. Necessário, assim, adotar medidas mitigatórias desse desequilíbrio de forças, restringindo o poder de voto a incorporadora a patamares razoáveis e que não acarretem a obliteração do poder de voto dos demais condôminos.

(…)

Pelo exposto, CONCEDO EM PARTE a liminar para, nos termos do pedido subsidiário do item I de fls. 28/29, tornar sem efeitos indicação/deliberação referente ao item B da ordem do dia da assembleia geral inaugural do Condomínio. (…) Defiro a complementação da liminar para que seja mitigado o direito ao voto da construtora para limitá-la a 1 (um) voto para cada 5 (cinco) unidades.

* TJSP – Processo Digital nº: 1009428-88.2022.8.26.0625 

 

 Celia Cristina Dourado é sócia da Karpat Sociedade de Advogados, especialista em direito condominial e atua na gestão do Departamento Contencioso Cível, prestando assessoria jurídica aos escritórios Karpat e seus parceiros, nos diversos Estados da Federação.    

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