O tempo da festa tem sido celebrado ao longo da História como tempo de utopias.
A FESTA, o que é a festa? O termo latino festus, era aplicado à celebração e ao culto dos “falsos deuses” e suas representações. Como expressão teatral de uma organização social, a festa é um fato político, religioso e simbólico. Traz a importante função de introjetar valores e normas da vida coletiva, sentimentos e conhecimentos comunitários.
A festa dentro da festa deve ser estudada, seja pela forma autoritária com que a recebemos pela transposição de valores ibero-europeus, pela cultura indígena e crioula em nosso país em priscas eras de nossa história. Eram tempos imemoráveis… relata Mary del Priori, em Histórias da Gente Brasileira- Colônia, v. 1 ).
Tempos de fantasias, de sonhos, celebrações, transformados em tempos de negação de um presente medíocre ameaçador e sufocante… Um exercício de liberdade humana! Um reencontro do homem consigo mesmo o angustia e deprime.
Mas, o tempo da festa eclipsa o calendário da rotina e do trabalho dos homens, substituindo-o por um tempo de criatividade, ora afirmando a perenidade das instituições de poder… Sem deter o tempo, nem contradize-lo, mas sim articulando-o, a festa termina por dar à vida diária sua armadura habitual. Complexas são as relações e representações que fazemos de nossa existência.
Jogo de espelhos, em uma festa “sem zombar, zombam de muitos”. Tempo invertido, de zombarias e disfarces. aquele da Festa Itinerante. Criador de brechas de resistência. Espaço de múltiplas trocas de olhares, risos e euforias. Em cada casa um significado peculiar, com vida própria. Distribuição de comida e bebida a animam, a música, o ritmo, permitem momentos de integração, partes de um todo comemorativo. As regras começam a ser abandonadas…
O Controle sobre a Festa: tentativa de ordenar o inordenável. Leis e regras procuram esvaziar a função catártica da festa. Luz, silencio, câmeras e vigilância- antídoto contra as transgressões? mas as festas não apenas ensejam reunião de pessoas, como ressaltam a necessidade de comunicação e socialização. Não são apenas uma válvula de escape, mas um grito desafiador. Circulando de festa em festa, a Festa Itinerante se torna um espaço de revolta ritualizada, de dar um fim à tristeza, de esquecimento.
Uma rajada de bom senso nos é trazida por Rodrigo Karpat.
Embora o controle da festa tente ordenar o inordernável, como muito bem colocou a Professora Maria Celeste, considerando que a festa tem como característica primordial celebração, precisamos lembrar que atualmente, por vivermos em grandes centros urbanos precisamos levar em conta o aumento natural e constante da população , que encontram como saída a construções de conglomerados de residências, denominados condomínios, é neste prisma que a festa com “limite” se faz necessário.
Porém, em tempo de pandemia, a máxima é a não realização de confraternizações e consequentemente nos deparamos com a diminuição dos problemas de convívio que delas surgem, o que em contradição a alegria, traz o tom cinza e melancólico a nossas vidas. O ser humano é social por natureza, tende a procurar o seu bando, a sua turma, a sua família.
Em nosso país ocorre a maior festa do mundo, com certeza o sorriso do brasileiro é reflexo da alegria contagiante do carnaval, a maior desordem que se tem relato no mundo todo. É sabido que em cidades como Salvador, Olinda, Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, a desordem se torna o grito de ordem, e os condomínios periféricos a estas grandes festas precisam entram na dança pelas suas sacadas, áreas comuns e até mesmo dentro de seus quartos, quando o movimento de desordem, como em uma inversão de valores, se torna momentaneamente a nova ordem, então a falta de regra virá a regra.
Porém, um temporal chamado Covid-19, apagou as luzes, tornando a vida de todos cinza, a páscoa se foi, os aniversários, viagens, os churrascos e tudo mais que pudesse ter aglomeração passou em branco e tudo isso foi imposto em um estado de exceção por lei, pelos decretos estaduais, municipais e federais que impuseram corretamente a ordem de não aglomeração e de imposição de distanciamento social.
No entanto, em meio ao distanciamento social, a flexibilização da quarentena, mesmo em momento ainda delicado, surge e mesmo que de forma tímida, as festas itinerantes, transformam o tom cinza e vermelho, em azul, amarelo, rosa e em todas as cores que pudermos imaginar. Como em um desenho infantil que perdeu a cor de repente, e que pode ser retomada magicamente através de festas itinerantes, que passam rapidamente e deixam a alegria no ar.
E em pleno São João, que comemora o nascimento de João Batista, que traz alegria a todas cidades brasileiras com quermesses, fogueiras, barracas do beijo, dos doces, do quentão, foi adaptada em tempo de Covid, para que pudesse continuar a levar alegria a milhares de lares que enfrentam problemas de convívio, perda de emprego, instabilidade emocional e outros.
No âmbito condominial com muita cautela e segurança, as festas juninas itinerantes podem ser realizadas e mudar um pouco a perspectiva no condomínio. Porém, precisamos verificar preliminarmente se no município e estado em que o evento será realizado não tem decreto em vigência proibindo aglomeração. Se houver o jeito será partir para o ambiente virtual.
Para que sejam viabilizadas as festas itinerantes o síndico ou um grupo de moradores lançam a ideia, e sendo a vontade da maioria, o condomínio monta uma comissão para dar início a organização, que deverá contar com a supervisão do síndico e a adoção de todas medidas de segurança, tais como suspensão da barraca do beijo e de brincadeiras de contato por exemplo. Deverá ocorrer de forma mais amena, mas sem perder a alegria do momento. Até a quadrilha deve ser suspensa e substituída por um cantor em um veículo itinerante ou no centro do prédio para que e as pessoas acompanhem das janelas e sacadas.
Para dar início a organização da confraternização é importante avaliar preliminarmente junto com os condôminos a aprovação ou não de festa. Isso pode ser feito por uma pesquisa simples no ambiente virtual.
O síndico tem autonomia para realizar decidir seguir em frente com a proposta, ainda mais se for tradição no condomínio, mas se não for a vontade da maioria, em função deste momento, a ideia deverá ser suspensa.
Caso a festa seja aprovada pela maioria, os horários devem ser restritos e o evento deverá ser mais parecida com uma celebração em família do que com um grande evento.
Imperioso destacar que se deve respeitar as regras de distanciamento social, colocação de totem de álcool gel e a limpeza deve ser reforçada. Uma boa sugestão também é distribuir cartilhas de procedimento. E, por ora, sem convidados de fora do condomínio. E, claro, o evento deve ser em local arejado, ao ar livre.
O orçamento para a confraternização deve ser levando em conta uma vez que estamos em um momento de poupar recursos, assim deve-se ter mente que o objetivo é trazer um pouco de alegria para os nossos condomínios e não exagerar na medida. É momento de solidariedade, confraternizar, nada de eventos profissionais e sim de encontro caseiro, alegre, mas respeitando distanciamento social, regras de segurança.
O prédio investe dentro de um orçamento aprovado em assembleia ou se destina uma verba para isso.
Porém, se as regras acordadas não forem respeitadas o síndico deve agir. O caminho para evitar problemas é organizar bem, dentro das normas de segurança, respeitando os decretos em vigência e orientar sempre a todos para que tudo ocorra de forma alegre e sem atritos.
A festa deve ocorrer respeitando as normas restritivas ou de abrandamento social em cada local e evitando aglomerações, e mesmo que a festa ocorra dentro do planejado no condomínio nada impede que qualquer um que se sinta prejudicado requeira alguma ação de forma judicial visando impedir a realização da festa itinerante dentro do condomínio. Porém, a palavra de ordem é, festejar para atrair coisas boas, sorrir e deixar a alma feliz.
Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos – Professora do Departamento de Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Livre-Docente em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pós-Doutora em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Rodrigo Karpat – Advogado militante na área cível há mais de 15 anos, Dr. Rodrigo Karpat é sócio no escritório Karpat Sociedade de Advogados, Coordenador de Direito Condominial na Comissão Especial de Direito Imobiliário da OAB-SP e referência em direito imobiliário e questões condominiais. É frequentemente solicitado entre os meios jornalísticos e ministra palestras por todo o Brasil.