Profundamente difícil o momento que a sociedade mundial atravessa. Para o cidadão comum, há pouco tempo, era impensável que viveríamos uma pandemia mundial, que restringiria o acesso da população a bens e serviços e manteria milhões de pessoas em suas respectivas residências, em quarentena.
Com esse cenário atual, certamente teremos muitas implicações que afetarão a maioria dos negócios, seja de grandes e pequenas empresas, seja do trabalhador comum e autônomo e, como consequência, escassez de receitas e recursos para as despesas básicas.
Nesse sentido, não resta dúvidas que tais fatos implicarão nas receitas e despesas dos condomínios, já que, cotas condominiais, nada mais são que rateios de despesas entre as unidades autônomas.
Tendo em vista que a receita dos condomínios para fazer frente às suas despesas (contas do consumo, salário de funcionários, obras emergenciais etc.) advém exclusivamente da contribuição dos condôminos com o adimplemento de suas cotas condominiais, o rateio entre as unidades deve permanecer inalterado.
É importante que os condôminos tenham ciência que sua contribuição através do pagamento das cotas condominiais, é destinado ao pagamento de contas essenciais para a sobrevivência do condomínio, em especial, contas de consumo e salários dos funcionários e colaboradores.
Por isso, em que pese a grave crise sanitária vivenciada, o condômino não está desobrigado a pagar sua contribuição perante o condomínio, sob pena de responder pela inadimplência conforme previsão na Convenção do Condomínio, art. 12 da Lei 4591/64, art. 1.336, I, do Código Civil e demais dispositivos legais.
Até porque, considerando que esta modalidade de obrigação provém da existência de um direito real sobre determinada coisa, a ela aderindo, impõe-se ao seu titular (condômino), a responsabilidade pelos encargos condominiais.
A manutenção dos pagamentos das cotas condominiais pelos condôminos, trata-se, portanto, de condição de existência do condomínio, sendo o dever do síndico e gestores condominiais cumprir e fazer cumprir a Convenção Condominial, nos termos do art. 1.348 do Código Civil, sob pena de responsabilização pela omissão ao não promover a cobrança dos inadimplentes.
Obviamente que em tempos de crise, os síndicos, administradores e gestores condominiais devem criar soluções e estabelecer planos de ação, utilizando sobretudo, o bom senso para que não tenhamos um aumento exponencial da inadimplência por parte dos condôminos.
Já prevendo o aumento da inadimplência em decorrência da crise financeiro-econômica que se avizinha no país, importante que os gestores condominiais iniciem corte de despesas consideradas não urgentes e convoquem os prestadores de serviços para renegociação dos contratos, ao menos neste momento de crise.
Este é o momento de renegociação, já que os prejuízos em decorrência da crise, devem ser compartilhados entre todas as partes envolvidas, do contrário, o resultado da inflexibilidade nas negociações, resultará em aumento significativo de ações judiciais, sobrecarregando o Poder Judiciário de forma imensurável.
Com a redução de despesas, o condomínio pode aumentar seu caixa para suportar eventual inadimplência de seus condôminos por certo período.
Aos síndicos e gestores condominiais, não é recomendável, em decorrência dessa grave crise, negociarem descontos/isenções dos pagamentos das cotas condominiais pelas unidades, sem autorização assemblear, sob pena de sua responsabilização e, pior, deixar o condomínio sem receita para fazer frente às suas despesas.
No entanto, o bom senso deve prevalecer. Necessário que seja avaliado caso a caso com certa flexibilidade no que tange ao parcelamento e/ou prorrogação dos débitos, visando atender aquele condômino que realmente não dispõe de recursos para pagamento imediato.
Seja como for, o síndico deve ter a cautela e solicitar apoio de seu departamento jurídico antes de adotar qualquer medida que vá contra as disposições da Convenção do Condomínio.
Dr. Marcelo Fonseca é Sócio da Karpat Sociedade de Advogados, membro da Comissão de Direito Condominial da OAB/SP, Pós-graduado em Processo Civil pela PUC/SP e especialista em direito imobiliário e questões condominiais.