Disposições sobre transação tributária no âmbito federal nos termos da lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020
Visando a diminuição dos impactos provocados pelo COVID19 – Coronavírus, em 14.04.2020, foi publicada no Diário Oficial da União (edição extra) a conversão da Medida Provisória nº 899 de 2019 para Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020, que instituiu a transação de créditos de natureza tributária ou não tributária no âmbito federal (II, IPI, IOF, IRPJ, IRPF, ITR, COFINS, CIDE, CSLL, PIS/PASEP e demais débitos de competência das autarquias vinculadas à União), denominada como “Lei do Contribuinte Legal”.
A transação no âmbito tributário é autorizada no art. 171 do CTN[1] e está prevista no art. 156, inciso III, do mesmo diploma legal, como uma das hipóteses de extinção do crédito tributário[2] que se caracteriza por uma forma de autocomposição entre o Fisco e o contribuinte, mediante concessões mútuas, podendo ser adotada quando houver interesse público[3].
Um dos principais aspectos, é que podem ser objeto de transação os créditos tributários não judicializados sob administração da Receita Federal e os inscritos na dívida ativa cuja cobrança é incumbida à PGFN[4], nas modalidades de proposta individual ou adesão ao edital[5], implicando na aceitação de todas as condições pelo contribuinte[6].
Para poder transacionar, o contribuinte deverá atender a determinados requisitos, sob pena de rescisão:
“Art. 4º Implica a rescisão da transação:
I – o descumprimento das condições, das cláusulas ou dos compromissos assumidos;
II – a constatação, pelo credor, de ato tendente ao esvaziamento patrimonial do devedor como forma de fraudar o cumprimento da transação, ainda que realizado anteriormente à sua celebração;
III – a decretação de falência ou de extinção, pela liquidação, da pessoa jurídica transigente;
IV – a comprovação de prevaricação, de concussão ou de corrupção passiva na sua formação;
V – a ocorrência de dolo, de fraude, de simulação ou de erro essencial quanto à pessoa ou quanto ao objeto do conflito;
VI – a ocorrência de alguma das hipóteses rescisórias adicionalmente previstas no respectivo termo de transação; ou
VII – a inobservância de quaisquer disposições desta Lei ou do edital.”
Os benefícios ofertados aos contribuintes são: a) descontos nas multas, juros de mora e nos encargos legais; b) prazos e formas de pagamento especiais; e c) oferecimento, substituição ou alienação de garantias e de constrições[7].
Por outro lado, há vedação expressa para os seguintes benefícios: a) redução do valor do montante principal do crédito; b) redução superior a 50% do valor total do crédito; c) concessão de prazo de quitação superior a 84 meses; d) negociação de créditos não inscritos na dívida ativa da União, exceto aqueles de responsabilidade da Procuradoria-Geral da União[8].
Ainda, é vedada a transação que a) reduza multas de natureza penal; b) concessão de descontos a créditos relativos ao Simples Nacional (enquanto não editada Lei Complementar autorizativa) e ao FGTS (enquanto não autorizado pelo seu Conselho Curador); c) envolva devedor contumaz (conforme definição de lei específica)[9].
Ressalta-se que a Lei nº 13.988/2020 excluiu a possibilidade de utilização de precatórios próprios ou de terceiros para amortizar ou liquidar o saldo devedor transacionado que anteriormente era prevista na Medida Provisória nº 899/2019. Isso deve resultar inclusive em alterações na Portaria PGFN nº 11.956/2019 que regulamentava como ocorreria a utilização dos precatórios.
Por fim, cabe destacar que a Lei n° 13.988/2020 acrescentou o art. 19-E à Lei n° 10.522/2002 para extinguir o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF)[10] que ocorria em caso de empate nos votos dos conselheiros da sessão, de modo que o presidente (obrigatoriamente conselheiro representante da Fazenda) solucionava a questão. Com a extinção do referido voto, em caso de empate, a questão deve ser solucionada favoravelmente ao contribuinte.
A legislação analisada é de suma importância, uma vez que estabelece um marco no Direito Tributário nacional, já que traz parâmetros para a União Federal realizar transação junto aos contribuintes, viabilizando um aumento na arrecadação federal. Além disso, facilitará que os devedores regularizem sua situação tributária quitando seus débitos com condições mais flexíveis.
Autor: José do Carmo Carneiro da Cunha e Silva – Advogado tributarista da Karpat Sociedade de Advogados
[1] Art. 171. A lei pode facultar, nas condições que estabeleça, aos sujeitos ativo e passivo da obrigação tributária celebrar transação que, mediante concessões mútuas, importe em determinação de litígio e consequente extinção de crédito tributário.
Parágrafo único. A lei indicará a autoridade competente para autorizar a transação em cada caso.
[2] “Art. 156. Extinguem o crédito tributário:
(…)
III – a transação”
[3] “Art. 1º Esta Lei estabelece os requisitos e as condições para que a União, as suas autarquias e fundações, e os devedores ou as partes adversas realizem transação resolutiva de litígio relativo à cobrança de créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária.
- 1º A União, em juízo de oportunidade e conveniência, poderá celebrar transação em quaisquer das modalidades de que trata esta Lei, sempre que, motivadamente, entender que a medida atende ao interesse público.”
[4] “§ 4º Aplica-se o disposto nesta Lei:
I – aos créditos tributários não judicializados sob a administração da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia;
II – à dívida ativa e aos tributos da União, cujas inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, nos termos do art. 12 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993; e
III – no que couber, à dívida ativa das autarquias e das fundações públicas federais, cujas inscrição, cobrança e representação incumbam à Procuradoria-Geral Federal, e aos créditos cuja cobrança seja competência da Procuradoria-Geral da União, nos termos de ato do Advogado-Geral da União e sem prejuízo do disposto na Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997.”
[5] “Art. 2º Para fins desta Lei, são modalidades de transação as realizadas:
I – por proposta individual ou por adesão, na cobrança de créditos inscritos na dívida ativa da União, de suas autarquias e fundações públicas, ou na cobrança de créditos que seja competência da Procuradoria-Geral da União;
II – por adesão, nos demais casos de contencioso judicial ou administrativo tributário; e
III – por adesão, no contencioso tributário de pequeno valor.”
[6] “Parágrafo único. A transação por adesão implica aceitação pelo devedor de todas as condições fixadas no edital que a propõe.”
[7] “Art. 11. A transação poderá contemplar os seguintes benefícios:
I – a concessão de descontos nas multas, nos juros de mora e nos encargos legais relativos a créditos a serem transacionados que sejam classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação, conforme critérios estabelecidos pela autoridade fazendária, nos termos do inciso V do caput do art. 14 desta Lei;
II – o oferecimento de prazos e formas de pagamento especiais, incluídos o diferimento e a moratória; e
III – o oferecimento, a substituição ou a alienação de garantias e de constrições.”
[8] “§ 2º É vedada a transação que:
I – reduza o montante principal do crédito, assim compreendido seu valor originário, excluídos os acréscimos de que trata o inciso I do caput deste artigo;
II – implique redução superior a 50% (cinquenta por cento) do valor total dos créditos a serem transacionados;
III – conceda prazo de quitação dos créditos superior a 84 (oitenta e quatro) meses;
IV – envolva créditos não inscritos em dívida ativa da União, exceto aqueles sob responsabilidade da Procuradoria-Geral da União.”
[9] Art. 5º É vedada a transação que:
I – reduza multas de natureza penal;
II – conceda descontos a créditos relativos ao:
- a) Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Simples Nacional), enquanto não editada lei complementar autorizativa;
- b) Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), enquanto não autorizado pelo seu Conselho Curador;
III – envolva devedor contumaz, conforme definido em lei específica.
[10] Art. 19-E. Em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o § 9º do art. 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte.