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Responsabilidade civil do síndico

O condomínio edilício é um ente de direito privado que nasce da vontade do particular ou por testamento, e depende do registro no Cartório de Registro de Imóveis para passar a existir juridicamente. (Art. 1.332 do Código Civil e Art. 7 da Lei 4.591/64).

Diferente do condomínio geral (Art. 1.314 do CC), o condomínio edilício tem partes comuns, que são compartilhadas por todos os condôminos sem espaços que pertençam a alguns de forma específica e partes privadas, de uso exclusivo.

É esta coexistência de coisas comuns e exclusivas que distingue o condomínio edilício do voluntário (Artigos 1314 a 1330 do CC), no qual a totalidade da coisa pertence aos condôminos, que terão sobre ela um quinhão, não havendo partes privativas.

As partes comuns e privativas integram o condomínio edilício como um todo, mas não se confundem. Sendo assim, o único instituto que permite que exista uma matrícula individualizada da área privativa é a chamada fração ideal, que, ao mesmo tempo fica vinculada à área comum, e que corresponda ao percentual que o proprietário tem da área total do imóvel.

Tão importante é a fração ideal que ela é inseparável da unidade imobiliária, nenhuma delas podendo ser alienada isoladamente, seja à título oneroso ou gratuito.

Em linguagem metafórica, a fração ideal é como a âncora que prende a unidade imobiliária ao solo.

Como os condôminos não se unem movidos pela “affectio societatis”, característica das pessoas jurídicas, o condomínio não é dotado de personalidade jurídica própria, autônoma, independente dos condôminos, constituindo-se num ente despersonalizado, assim como a família, o espólio, a massa falida, os grupos de consórcio e as sociedades de fato.

Mas por questão prática atribui-se a eles legitimidade para estar em Juízo ou praticar atos e negócios jurídicos, no interesse e na defesa dos direitos dos seus integrantes.

Para isto era necessário atribuir ao condomínio, bem como aos demais entes desprovidos de personalidade, um representante legal, que por eles pudesse emitir vontade, vinculando seus integrantes.

No caso do condomínio edilício este representante é o síndico, eleito pelos condôminos, por maioria simples em Assembleia Geral, para tanto convocada (Artigo 1347 do CC)

Ao síndico cabe representar o condomínio ativa e passivamente, dentre outras atribuições legais (Art. 1.348 do CC), além de ter papel fundamental na gestão do condomínio, exercendo as funções executivas de administrador.

E mesmo que a atuação de síndico esteja sempre atrelada e limitada as deliberações em assembleia, convenção condominial, ao regimento interno e ainda a legislação esparsa pertinente, tem o síndico papel fundamental e autonomia funcional para gerir o patrimônio coletivo da forma que melhor lhe pareça, buscando sempre o interesse coletivo e a guarda e manutenção das áreas comuns. (Art. 1.348, V CC)

A autonomia e a forma de gestão do síndico fazem a diferença entre condomínios bem geridos, valorizados, e prédios sucateados, desvalorizados e com problemas de gestão.  Estima-se que a desvalorização por má gestão supere em 30% o valor do patrimônio, o que a todos prejudica.

E por exercer um cargo eletivo, é que o síndico, pessoa física ou jurídica, estranho ou não ao condomínio, passa a ter responsabilidades legais atinentes exclusivamente a função que exerce.

Por responsabilidade civil, entendemos aquela que se caracteriza por uma ação ou omissão, intencional (dolosa) ou por negligência, imprudência ou imperícia (culposa), e que venha a causar danos a terceiros (ato ilícito), sejam estes danos materiais ou morais (Art. 186 c/c 927do Código Civil).

E quando o dano tiver ocorrido, seja por ação ou omissão, nasce para o direito um ato ilícito cuja consequência imediata é o dever de indenizar a vítima.

A responsabilidade civil tem o objetivo de reparação do prejuízo causado a terceiros, além do caráter punitivo da medida para que se evite que casos assim se repitam.

Mas para que se caracterize a responsabilidade civil e a obrigação de se reparar um dano é imprescindível que exista: a) uma ação ou omissão culposa, b) um dano, c) e a relação entre essa ação ou omissão e o resultado (nexo causal).

No meio condominial, podemos citar, à título de exemplo, entre tantos, o fato de alguém, condômino ou não, sofrer uma queda, que lhe traga lesões físicas, em função do piso estar escorregadio por não ter o faxineiro providenciado o enxugamento adequado nem colocado o aviso do risco. O dano, portanto, decorreu da ação omissiva do preposto do condomínio, recaindo a responsabilidade sobre todos os condôminos, pelo ato de terceiro.

É importante distinguir a responsabilidade civil do condomínio, a ser suportada por todos os condôminos, que ratearão a indenização, da responsabilidade civil do síndico, que decorre da violação de um ou alguns de seus deveres legais ou convencionais, causando dano aos condôminos ou a terceiros.

Na teoria geral da responsabilidade civil duas grandes vertentes se defrontam: a subjetiva, também conhecida como teoria da culpa, que se aplica à responsabilidade extracontratual, cabendo à vítima do dano o ônus da prova da culpa do seu autor, e a objetiva (teoria do risco), que prescinde da discussão sobre a culpa, bastando que a vítima demonstre o dano e o nexo causal.

No âmbito do condomínio há divergências doutrinárias quanto à teoria a se aplicar, considerando algumas decisões, cada vez mais numerosas, que a atividade do condomínio, em função de sua natureza, implica em risco para terceiros, condôminos ou não, o que atrai a incidência do parágrafo único do artigo 927 do CC, tonando objetiva a sua responsabilidade.

Neste sentido:

Responsabilidade civil – Queda de portão – Autora que sofreu lesão na cabeça que ocasionou grande corte e sutura com vários pontos – Responsabilidade objetiva do condomínio – Teoria do risco – Artigos 927 e 938 do Código Civil – Nexo causal incontroverso – Dano material evidente – Indenização que não comporta redução – Honorários sucumbenciais reduzidos – Recurso parcialmente provido.

(TJ-SP – APL: 10694334620158260100 SP 1069433-46.2015.8.26.0100, Relator: Eduardo Sá Pinto Sandeville, Data de Julgamento: 09/12/2016, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/12/2016)

Se a responsabilidade Civil é igual para todos em tese, então por que falamos em responsabilidade civil específica do síndico?

Porque a responsabilidade do síndico emana da lei, assim como o policial tem o dever de inibir um crime (Art. 23, III do Código Penal e Art. 301,Código de Processo Penal), mesmo que esteja fora de serviço, em função do estrito cumprimento do dever legal, e o médico não pode se omitir em um salvamento, sob pena de omissão de socorro (Art. 135 do Código Penal, e Art. 58 do Código e Ética Medica), o síndico tem o dever poder de diligenciar e fazer a guarda das áreas comuns do prédio ( Art. 1.348,V do Código Civil), isso faz com que ele responda por questões especificas que um cidadão não síndico, não responderia.

O síndico tem por lei responsabilidades específicas perante a sua comunidade e omitir-se delas poderá desaguar em responsabilidade civil e em alguns casos em responsabilidade criminal. E em casos específicos, quando agir com excesso no exercício da função o síndico poderá responder   com o seu patrimônio pessoal.

Código Civil

“Art. 1.348. Compete ao síndico: V – diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que interessem aos possuidores”

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA. RESPONSABILIDADE CIVIL DE SÍNDICO. IRREGULARIDADE NA ADMINISTRAÇÃO DO CONDOMÍNIO. DEVER DE RESSARCIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Aquele que administra bens ou interesses alheios tem o dever de prestar contas de sua gestão em favor de quem se deu a referida administração. 2. É ônus do réu provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, conforme artigo 333, inciso II, do Código de Processo Civil. 3. Não demonstrando o demandado (ex-síndico) que executou os serviços contratados conforme as notas fiscais, bem como restando caracterizado que não obedeceu às normas legais e da convenção de condomínio, deve ser responsabilizado pessoalmente pelas irregularidades na administração dos recursos do condomínio. 4. Recurso conhecido e desprovido.

(TJ-DF – APC: 20130111009823, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, Data de Julgamento: 02/09/2015, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 14/09/2015. Pág.: 561) (GRIFEI)

Conforme mencionado, a responsabilidade civil existirá quando alguém diante de uma ação ou omissão causar danos a terceiros. Caso em que, na esfera cível, nasce a obrigação de repará-lo, assumindo assim o autor do dano, as consequências que este dano tenha causado.

E por conseguinte o condomínio, não o síndico, responde diretamente no caso de danos, porém se o síndico agiu com excesso no exercício da função, não observando a lei ou causando prejuízo direto a terceiros (por exemplo no caso de apropriar-se de dinheiro indevidamente, não recolhimento de INSS ou falta de manutenção do prédio) poderá responder pessoalmente desde que comprovada a sua atuação direta ou comportamento omissivo que culminou em prejuízo a terceiros.

Neste sentido quanto ao não recolhimento do INSS:

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONDOMÍNIO RESIDENCIAL.PRESCRIÇÃO DE OFÍCIO DA APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA, ART. 168-A DO CP. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ARTIGO 337-A, I DO CP. AUTORIA E MATERIALIDADE CONFIGURADAS. SÍNDICOS. DOLO GENÉRICO. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA NÃO CARACTERIZADA. FRAUDE. DOSIMETRIA MANTIDA. NON REFORMATIO IN PEJUS. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA

SUBSTITUTIVA, DE OFÍCIO, À UNIÃO. APELAÇÕES DEFENSIVAS NÃO PROVIDAS.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0011323-97.2006.4.03.6102/SP2006.61.02.011323-0/ SP RELATOR: Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI  20/10/2.015

Em seu voto o Desembargador Relator JOSÉ LUNARDELLI aduziu:

“Na verdade débitos pretéritos e má gestão anterior não justificam que se onere o sistema previdenciário. Caberia aos réus, como síndicos, elevar o valor cobrado de cada condômino, ao invés de optar por financiar as contas do condomínio à custa do Fisco.XXXX (fl. 640) expressamente assente que se reunia com os conselheiros fiscais e consultivos e com eles definia as prioridades de pagamento e que, embora houvesse um contador, a palavra final era sua, no sentido de se reduzir o valor referente às contribuições previdenciárias devidas pelo condomínio.”

Por ter o síndico o poder dever que emana da lei, o qual lhe confere condições de tomar as medidas necessárias para a conservação das áreas comuns, caso síndico não o faça estará assumindo responsabilidades em nome próprio por se omitir no cumprimento da função.

Daí se conclui que ao assumir a função de síndico assume ele graves responsabilidades, perante os condôminos e terceiros, o que exige redobrados cuidados no exercício da função.

Responsabilidade Criminal

No âmbito criminal a responsabilidade ocorre de forma bem parecida com a Responsabilidade Civil. Basta que o caso ocorrido, independente da esfera civil, esteja tipificado no Código Penal como “crime”, se por exemplo: Uma área externa do prédio está em más condições e o síndico não faz os reparos corretivos necessários, e caso alguém caia neste local comum pelo fato do piso estar quebrado ou escorregadio.

Neste caso, existirá uma responsabilidade civil do condomínio em indenizar os danos matérias sofridos, tais como remédios, curativos, cuidados médicos e dano moral se comprovado, mas também a responsabilidade criminal, pois o acidente no caso hipotético deu causa também a uma lesão corporal (Art. 129 do Código Penal).

E como existe um crime que está tipificado no Código Penal de lesões corporais ( Art. 129 CP) o síndico poderá responder criminalmente uma vez que o Código Penal em seu Art. 13º considera autor do crime não somente quem deu causa direta, mas também considera causa do crime a omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido, “Código Penal Art. 13 – O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”

A situação do síndico é agravada pelo fato dele ter por lei o dever de cuidado, o que faz com que o gestor assuma a responsabilidade de evitar o resultado.

Sendo a sua omissão, no caso em consertar o piso, relevante para a ocorrência do resultado. Código Penal Art. 13º § 2º – A omissão é penalmente relevante quando o emitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)( GRIFEI)

Conclui-se que, tanto os danos causados a terceiros em áreas comuns, oriundos de ações ou omissões do síndico no exercício das suas funções, atos de terceiros, geram consequentemente dever de indenizar no âmbito civil, bem como as omissões podem ser penalmente relevantes e imputando ao gestor em casos concretos o crime tipificado em Lei.

Dr. Rodrigo Karpat – Advogado militante na área cível há mais de 10 anos, é sócio fundador do escritório Karpat Sociedade de Advogados e considerado um dos maiores especialistas em direito imobiliário e em questões condominiais do país. Além de ministrar palestras e cursos em todo o Brasil, é colunista da ELEMIDIA, do portal  IG, do site Síndico Net, do Jornal Folha do Síndico, do Condomínio em Ordem e de outros 50 veículos condominiais, além de ser consultor da Rádio Justiça de Brasília  e ter aparições em alguns dos principais veículos e programas da TV aberta, como É de Casa, Jornal Nacional, Fantástico, Programa Mulheres, Jornal da Record, Jornal da  Band, etc. Também é apresentador do programa Vida em Condomínio da TV CRECI. É membro efetivo da comissão de Direito Condominial da OAB/SP e na Comissão Especial de Direito Imobiliário é coordenador de Direito Condominial.

Dr. Sylvio Capanema – Formado em Direito pela Faculdade Nacional de Direito em 1960. Exerceu a advocacia durante 33 anos, na área do Direito Imobiliário, tendo sido coautor do contra projeto de lei que resultou na Lei do Inquilinato atual. Em 1994, ingressou na Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, representando o 5.º constitucional da advocacia. Exerceu, no Poder Judiciário, as seguintes funções: Presidente da 10.ª Câmara Cível, Membro Efetivo do Órgão Especial, Membro Efetivo do Conselho da Magistratura, 2.º Vice-Presidente e 1.º Vice-Presidente. Professor titular de Direito Civil da Universidade Cândido Mendes desde 1964. Professor titular de Direito Civil da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro, recebendo o título de Professor Emérito. Voltou a exercer a advocacia após a aposentadoria como Desembargador. Chefe do escritório Sylvio Capanema de Souza Advogados Associados.

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