Acionar a Justiça, procurar órgãos reguladores e o Procon, ou mesmo trocar de empresa, pode diminuir a dor de cabeça
Caroline Monteiro
ESPECIAL PARA O ESTADO
Uma imobiliária conceituada tem algumas qualidades: encontra um bom inquilino, faz um contrato seguro, presta atenção às exigências de locador e locatário, responde dúvidas, soluciona conflitos e repassa o pagamento em dia. É a prestação de serviços do sonhos, mas nem sempre é assim.
A arquiteta Ivani Abreu (nome fictício), de Guarulhos, contratou uma imobiliária para tomar conta de seus quatro imóveis. No começo, tudo ocorreu bem, mas, depois a empresa parou de prestar bons serviços. “Ela começou a atrasar o repasse. No início, achei que o inquilino não estava pagando, mas descobri que a imobiliária recebia os valores e não me enviava”, conta.
Além de não fazer o pagamento, a imobiliária também não atendia às solicitações do inquilino, dificultando a comunicação entre as partes. “O locatário deixou o imóvel com uma dívida de R$ 40 mil com a empresa de água e esgoto. Ele disse que tentou avisar a imobiliária de um vazamento na casa, não conseguiu, e a conta foi aumentando. Agora, estamos negociando a despesa”, diz a arquiteta.
Para resolver o problema, Ivani tem algumas alternativas. Pode procurar a polícia e denunciar a empresa por apropriação indébita. “É o artigo 168 do Código Penal. Geralmente, a imobiliária tem de 3 a 5 dias úteis para repassar o valor do aluguel. Mas se fica com o dinheiro do proprietário, ela pode ser acusada de crime”, diz o advogado especialista em direito imobiliário, Rodrigo Karpat.
Outra opção é procurar o Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci) e fazer uma denúncia. “Caso se sinta prejudicado no atendimento do corretor ou da imobiliária, o proprietário pode nos procurar. Então, o Conselho instaura um procedimento de apuração dos fatos, extrajudicialmente”, diz o presidente do Creci-SP, José Augusto Viana Neto.
O órgão ouve o denunciado e propõe uma audiência de conciliação. Caso os problemas não sejam resolvidos pelo conciliador, pode-se dar seguimento a um processo ético disciplinar. “O Conselho tem o poder de aplicar sanções administrativas ao corretor ou à imobiliária (e não judiciais), como multa, suspensão do exercício de atividade e até cancelamento da inscrição”, diz Viana. A condenação no tribunal do Creci pode servir de prova para que o denunciante procure a Justiça. Ou, caso o Creci apure que a imobiliária se apropriou de dinheiro, pode ele mesmo fazer a denúncia ao Ministério Público, por exemplo.
Segundo Viana, a junta de conciliação da entidade resolve a maioria dos problemas que chegam até o Conselho. “Geralmente, os desentendimentos acontecem por divergência na interpretação de legislação. Mas quando tratamos de pagamentos, buscamos o ressarcimento total e absoluto da pessoa prejudicada, seja o inquilino ou o dono do imóvel. Queremos proteger a sociedade dos maus profissionais”, diz.
Outro órgão capaz de auxiliar quem tem problemas com a imobiliária é o Procon, que pode tanto mediar os conflitos como prestar esclarecimentos sobre os direitos do consumidor. “Quando as regras não estão discriminadas na lei do inquilinato, o Procon pode agir de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, pois entende que é uma relação de consumo, principalmente entre a empresa e o proprietário, que paga a taxa mensal para a imobiliária administrar o aluguel”, diz a coordenadora de área do Procon-SP, Renata Reis.
No site do órgão, há uma lista d e perguntas relacionadas à habitação e locação, que podem esclarecer dúvidas. “O inquilino também pode procurar o Procon, se sentir que está sendo lesado em casos de cobrança de taxas administrativas de emissão de boleto, por exemplo, independentemente do que está escrito no contrato.”
O Sindicato de Habitação (Secovi) também resolve conflitos que envolvem o mercado imobiliário, entre condôminos, síndicos, imobiliárias, corretores, construtoras, incorporadoras, inquilinos e proprietários. O serviço é pago.
Troca. Além da alternativa de procurar os órgãos de resolução de conflitos ou a Justiça, o proprietário que tiver problemas com a empresa que administra seu aluguel pode rescindir o contrato e trocar de imobiliária, segundo o especialista em direito imobiliário e sócio da DGCGT Advogados José Guilherme Siqueira Dias.
“O contrato de locação é uma coisa e o de administração é outra. É possível trocar de empresa, caso ela não esteja cumprindo com suas obrigações ou não esteja atendendo às expectativas do dono do imóvel, e continuar com o inquilino”, diz.
Segundo Siqueira, a dúvida é comum, porque as pessoas confundem o serviço de corretagem com o de administração. “Quando a empresa encontra um inquilino, o dono paga uma taxa por esse serviço, que geralmente é o repasse integral do primeiro aluguel. Pelo gerenciamento mês a mês, o contrato é separado. A taxa gira em torno de 10% do valor e é paga mensalmente. Em geral, esse serviço pode ser rescindido por qualquer uma das partes desde que solicite com 30 dias de antecedência”, diz. Os prazos do contrato de locação – entre proprietário e inquilino – são outros e independem da imobiliária, esclarece Siqueira.
Advogados dão dicas de como escolher a empresa certa
Para evitar problemas, a melhor dica é escolher bem a empresa que administrará o seu imóvel e fará a ponte com o inquilino. De acordo com o advogado especialista em direito imobiliário, Rodrigo Karpat, é imprescindível confirmar que o profissional ou a empresa tem o registro no Conselho Regional de Corretores de Imóveis e que o cadastro está válido e ativo.
“No site do Creci, é possível verificar se os corretores estão suspensos ou sofrem processos ético-disciplinares”, diz.
“Escolha uma imobiliária renomada, que tenha um corpo de advogados que cuidarão do contrato e de possíveis problemas que podem ir para a esfera judicial”, diz o especialista em direito imobiliário e sócio da DGCGT Advogados José Guilherme Siqueira Dias. “Pesquise a reputação em sites como Procon e Reclame Aqui e confira se não há processos no Tribunal de Justiça.”
A advogada Gabriela Marcondes, do escritório Viviane Amaral Advogados Associados, diz que, depois de verificada a idoneidade da empresa, e mesmo que ela tenha uma equipe jurídica, o locador pode procurar um advogado de confiança para analisar a minuta. “É preciso ter plena ciência dos termos e condições do que está sendo contratado (prazos, multas, valores). É possível estabelecer as cláusulas protetivas da operação, como multas por inadimplemento para a imobiliária.”
Siqueira lembra que não é necessário fazer a administração com a empresa corretora. “Você pode optar por fazer o contrato diretamente com o inquilino, ou com uma empresa diferente daquela que encontrou o locatário para você. Se o corretor atrelar obrigatoriamente os dois contratos, isso configura venda casada”, diz.
Para Siqueira, a boa administradora é aquela que traz conforto na gestão do patrimônio. “Se o proprietário tem vários imóveis e não sabe como gerir, a imobiliária vai prestar esse serviço – que é diferente da corretagem. Ela deve controlar se o inquilino pagou taxas, impostos e contas. Tem de fazer esse acompanhamento das obrigações de ambas as partes. Precisa atender e mediar tratativas quanto às obras, reparos e consertos”, afirma Siqueira.
O advogado sugere uma cláusula para evitar dor de cabeça no repasse dos pagamentos. Segundo ele, como o valor maior é do proprietário, faz mais sentido que o inquilino pague diretamente ao dono do imóvel que, depois, repassa a taxa de 10% para a imobiliária. “É melhor o locador receber e, depois, pagar a prestação do serviço. Isso traz mais proteção e não significa que a imobiliária não vá cobrar o inquilino, caso ele não pague.”
Fonte: O Estado de São Paulo